quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Bruce Springsteen e sua The E Street Band em São Paulo

*Vai pra série: Shows da minha vida...

Apoteótico. 

Entrei na fila do Espaço das Américas, com aquela sensação de ansiedade de quando algo extraordinariamente arrebatador está preste a acontecer. É uma sensação que se assemelha muito com aquela do corpo quando reage por instinto tentando alertar do perigo, só que aqui o inverso. Saí do meu trabalho nervoso, cheguei na Barra Funda nervoso. Até interagir com fãs de Bruce na fila. É aquele tipo de fãs que aqui no Brasil não se encontram tantos quanto na Europa onde o The Boss é venerado. Aqui devido as poucas vezes que apareceu no país (incluindo apenas uma unica visita em 1985, durante um evento dos direitos humanos realizado no estádio do Parque Antarctica), a pouca visibilidade que teve durante todos esses anos fizeram com que passe batido pelo Brasil sua vinda, comparado com outros países. Entretanto, seus fãs são devotos. Muitos vieram de diversas partes do país, e até de outros países. Vi gente de Portugal, Chile, EUA, que seguem como peregrinos os concertos da lenda da música. Música essa que transpõe barreiras continentais. Suas canções são hinos que não se silenciam ao passo dos anos.

Quando os portões se abrem as 19h, entro no espaço com o coração parecendo que não se contenta em permanecer entre ossos, carne e pele. Parece saltar em certos momentos. E o show nem sequer começou. Quando junto de duas garotas que conheci na fila, Mariana e sua mãe, fomos até perto do palco. Era uma visão bastante boa, facilitada por eu ter pego a pista Premium, que dava uma certa distancia consideravel da pista comum. Ali estavam pessoas que pude conversar. Sinto muito não ter pego contato com alguns ali. Pessoas que dão duro em suas vidas, passam por problemas financeiros, mudam de cidades, carregam histórias de vida, de superação, de relacionamentos, sempre com as canções de Bruce entrando, assim digo invandindo suas vidas como trilhas sonoras de filmes que surgem ao fundo da cena. Conheci um homem que estava com sua esposa. Nitidamente, por razões mil, os dois não pareciam estar num bom momento do relacionamento. O cara se mudou para Maringá/PR, acho. Sua mulher em São Paulo. Talvez a distancia tenha sido o pivo desse desgaste visivel em indiretas um ao outro do tipo "nem parece que você tem tanto tempo assim em casa...", coisas do tipo. Pareciam ser de um casal de classe média alta na faixa dos 30, 40 anos, que se desdobravam para manter o status financeiro como podiam, talvez até mesmo por terem filhos, enfim. O homem me contava ao lado de sua mulher a fascinação que tinha pelo Springsteen. Era um garoto e quando tocava uma de suas canções na rádio corria para escutar, cresceu comprava LP's e assim surgiu em sua vida uma garota (se tratava da sua mulher que estava ao seu lado no show) que também tinha o habito de comprar LP's do The Boss, e assim começou um romance que durou até os dias de hoje, custe a que custar. Eles me contavam que trocavam os LP's que ouviam, e conversavam, ele no caso nervoso puxava conversa com a garota que queria ter pra si como sua mulher. Engraçado ali divaguei, como as vidas e não só a deles, é só assistir ao documentário Springsteen and I, produzido por Ridley Scott, como pessoas no mundo inteiro tem histórias de amor, superação e amizade que se entrelaçam com hits como "Badlands", "Born to Run" e "Glory Days".




De repente, entra no palco Bruce e sua E Street Band enfurecidos ao som de guitarras que pareciam nos fazer acreditar que aquilo não parecia muito ser algo fácil de acreditar. Por recomendações feitas, Springsteen abriu seu primeiro show no Brasil com um clássico do rock protestante dos anos 70 de ninguém menos que Raul Seixas, a enérgica "Sociedade Alternativa". Estouro. A garota que estava ao meu lado, as centenas que estava ao meu redor simplesmente diziam "PQP", "Bruce!", sem terem o que dizer estasiados pulavam com as mãos ao alto entoando vendo um Bruce com sua Telecaster arrebentando e... cantando a música em PORTUGUÊS. Foi dificil não ficar estasiado. Foi um daqueles momentos da sua vida que você para e curte faiscas da sensação ali tomadas no ar, no ambiente do espaço. Foi foda.

Fonte: Scream Yell


Fonte: Scream Yell

Ele entrou no palco as 21h14, e logo soltou um "hello, São Paulo!" e em português disse "estou muito feliz por estar aqui". Tocou Raul em guitarras pesadas, e já logo soltou a incrível faixa "We Take Care Of Our Own", do mais recente disco "Wrecking Ball", razão da turnê que vem fazendo. Foi lindo. Num show que tocou por 3 horas e 17 minutos, 29 canções de sua carreira, soou pelo ambiente sons inesquecíveis que fez com Clarence Clemmons, morto em 2011 por decorrencia de um derrame, em discos incríveis como "Born to Run". Ali esteve faixas como "Tenth Avenue Freeze-Out", onde no meio do espaço das Américas atravessando a multidão tocou com o sobrinho Jake Clemons a faixa enquanto no telão mostrava imagens do tio eternizado e sempre lembrado por Bruce em seus shows. Em seguida embalou um clássico dos seus shows, uma versão do som dos The Isley Brothers, a barulhenta e dançante "Shout". Acompanhada de uma versão de "This Little Light of Mine", dos The Steeles. Foi quando o show enfim após visivelmente Bruce ter entregado seu melhor no palco, derramando suor e balões de água que estourava contra a si para apagar o calor que sentia após ter se jogado na platéia, para ser carregado por seus fãs até a outra base do palco no meio da multidão. Pulado, tomado cerveja de um fã, corrido, estremecido o ambiente com riffs célebres de hits como "Born To Run" que pós o lugar abaixo. "Dancing in The Dark", "Because The Night" e "Born in The U.S.A." E "We Are Alive", do novo disco.



Depois do bis, ele volta sozinho com sua gaita e um violão. Numa sensação atordoante e já sentindo falta do cara incrível que se entregou para todos os que foram até ali, fiquei meio triste até. Pensei vou ter que voltar pra casa depois disso e alimentar tudo o que aconteceu nessa noite que foi mágico. Um breve momento de nossas vidas que tudo parece tão grande demais, que o mundo em suas canções, em sua atitude não conseguem caber num show de mais de três horas. Que só voltando a fita em nossas mentes para aquele dia 18 de setembro de 2013 parece ser capaz de nós fazer entender o significado disso tudo. Afinal, um show do Bruce como a Rolling Stone elegeu como o maior show da atualidade, de um cara que já passou por tanta experiencia em sua vida, ainda é uma flama acesa de puro rock'n'roll. Seu show não é pra ser quantificado, e sim apreciado e uma grata felicidade durante aquelas boas horas que ali pôde proporcionar. A proposito ele volta sozinho para tocar sua dilacerante "This Hard Land", faixa que cela o disco de Greteast Hits que lançou em 1995. Uma canção que fala de lugares que fomos, estamos ou vamos um dia. Que fala que o aqui não é tudo o que vamos ter um dia, basta ter sonhos e fé que tudo é possível. Enfim, uma canção que deixa em aberto nossas vidas escritas por nós mesmos. Quando ele finaliza com esses versos: "Well if you can't make it stay hard, stay hungry, stay alive if you can. And meet me in a dream of this hard land", e engata com sequencias de gaita avassaladoras, uma parte de mim espera que possa ter essa sensação mais uma vez na vida. É torpente, tocante e memorável.
Valeu Bruce!


                                                O lugar não atingiu lotação máxima de 8 mil, mas encheu de gente até.


Bruce prometeu que voltará mais vezes e não vai mais esquecer de aparecer pelo Brasil nas próximas turnês, todos ali ficaram aliviados em ouvir. Ninguém deseja esperar mais de 20 anos para vê-lo de novo por aqui.



Fonte: Scream  Yell



Bruce trazendo a bela 'Hungry Heart'